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CESAR .


2017-09-11T00:00:00

Educação


Escola e inovação educacional no novo mundo do trabalho

por Luciano Meira

A aprendizagem é um ato dialógico e interacional, afetivamente motivado, no qual práticas como a imaginação, a criatividade, a argumentação e a reflexão são aspectos centrais e compartilhados entre os diversos atores presentes na escola.

Este breve artigo nasceu da compilação de notas produzidas para o evento ACONTECE Educação: O Profissional do Futuro, que ocorreu no dia 08 de Junho de 2017, realizado pelo CESAR em parceria com a Escola Eleva, no Rio de Janeiro. As notas foram criadas como provocações para alimentar o debate sobre inovação educacional e mercado de trabalho. Enquanto provocações, espero disparar no leitor o diálogo e resolução de problemas que caracterizam qualquer situação de aprendizagem.

Os pontos não estão acompanhados, ainda, de muitos dados já disponíveis na literatura especializada ou dos argumentos completos que sustentam as ideias oferecidas. Meu propósito aqui é gerar o debate, amadurecer as ideias enquanto diálogo, e resolver as questões mais complexas junto com o leitor, tratando-se assim, de um codesign de artigo! Caso estas notas gerem debate, outros pontos de vista e contra-argumentos, terei cumprido minha missão.

Provocação 1: A aula faliu, mas a escola deve ficar e ser fortalecida.

Em um projeto contemporâneo de escola, o conceito de “Aula” é problemático, na medida em que aposta em metáforas de transmissão de informações e retenção de aprendizagem, indefensáveis do ponto de vista dos estudos científicos mais atuais sobre o desenvolvimento humano.

Apesar disso, a escola é um espaço vital de manutenção da cultura e construção da vida cotidiana, portanto instrumento fundamental de atração e fortalecimento da comunidade, da escuta de seus desejos e feedback para suas demandas.

Provocação 2: O professor não é, por sua natureza, resistente a mudanças.

Conta-se maliciosamente que, viajantes no tempo desde o séc. XIX, médicos se sentiriam inúteis numa sala de cirurgia atual, enquanto professores oriundos da mesma época ficariam muito confortáveis nas salas de aula. Essa narrativa é mal intencionada e esconde o papel da sociedade, das empresas e do Estado na história dos hospitais e das escolas. Esconde, em particular, o quão raramente essas instituições se lançaram intencionalmente no redesenho da escola, em codesign com professores e alunos, tanto quanto o fizeram no redesenho da medicina e dos artefatos médicos.

Por outro lado, precisamos fortalecer a imagem do professor enquanto empreendedor da mudança, metaforizando a sala de aula como uma startup (sem fluxos de caixa, claro!) e os alunos como os colaboradores e protagonistas da missão da escola: A criação de cenários de aprendizagem.

Provocação 3: A mudança será hiperlocal e a inovação encapsulada em um movimento sustentável.

Como no “jornalismo hiperlocal”, que busca valorizar a novidade e a autoria a partir de microrregiões da cidade, a aposta da inovação educacional deveria ser também no protagonismo dos jovens e seus professores para a mudança realizada a partir da própria escola, como no movimento de ocupação das escolas de ensino médio da rede pública de São Paulo em 2015. Nesse sentido, talvez também seja necessário guardar certa independência e mesmo desobediência em relação às leis e normas complementares constantemente reeditadas.

Por outro lado, “encapsular a inovação” significa ser capaz de transformar a realidade em parcelas sustentáveis e crescentemente escaláveis, seja na forma de práticas didáticas inovadoras ou de uma gestão que acolhe e amplifica os protagonismos de estudantes e professores.

Provocação 4: O centro da educação não é o aluno, mas a construção de relações entre alunos e professores.

É importante reconhecer o lugar histórico da centralidade do aluno nos processos educacionais na escola, como uma reação ao império do conteúdo, presente em movimentos como a “Matemática Moderna” dos anos 70.

Mas, a aprendizagem é um ato dialógico e interacional, afetivamente motivado, no qual práticas como a imaginação, a criatividade, a argumentação e a reflexão são aspectos centrais e compartilhados entre os diversos atores presentes na escola. Assim, a própria existência do ato educacional se sustenta fundamentalmente na construção de relações entre professores e alunos, sendo preferencialmente, relações de empatia e aproximação.

Provocação 5: As escolas são espaços de autoria, propícios à implementação de práticas de formação inovadora de professores!

A mudança deve seguir na direção de mais autoria e participação social. Dois projetos para os quais contribuí recentemente mostram a viabilidade e poder de perspectivas nessa direção. O projeto Professor Autor é um concurso de autoria de “aulas”, no qual professores da rede pública competem pela submissão das melhores apresentações de conteúdos acadêmicos em multimídia. O LED (Laboratório de Experimentações Didáticas) foi inspirado no Startup Weekend e ganhou vida como um evento para engajar educadores na criação colaborativa e experimentação de soluções didáticas e arranjos sociais inovadores para a escola.

Provocação 6: O desafio: transformar as escolas em “maker spaces” da produção de práticas e artefatos didáticos ricos em significado.

A escola ainda está estruturada sobre currículos intensivos em conteúdos, frequentemente estranhos e/ou sem significado para as crianças e professores, especialmente se levarmos em conta o mundo do trabalho. Ao mesmo tempo, encontramos na escola quase nenhuma abordagem emocional, por exemplo, tendo em vista o desenvolvimento de competências como resiliência e liderança, agora lembradas na nova Base Nacional Curricular Comum. Uma escola Maker é inovadora porque tem foco no desenvolvimento de competências que passeiam por exemplo, do pensamento computacional ao pensamento crítico, da inteligência social ao design mindset.

Provocação 7: Depois do Problem Based Learning (PBL), o Imagination Based Learning (IBL) conectado ao dinâmico e mutante mundo do trabalho.

Em consonância com a ideia de encapsular a inovação, precisamos prototipar a mudança. Por exemplo, podemos experimentar com programas de economia criativa e pensamento computacional nas escolas, com foco no mundo do trabalho, valorizando as tradições e competências das comunidades locais.

A economia criativa captura hoje 22% dos trabalhadores formais do Brasil e contribui com cerca de 17% do produto interno bruto (PIB) do país, com avanço estimado de 70% nos últimos dez anos, contra 36% de crescimento do PIB total. No entanto, apenas 3% dos estudantes fazem algum tipo de estágio que lhes dão a prática de algum tipo de ambiente profissional.

Vale a pena ensaiar estratégias mais complexas de interseção entre escola e trabalho, num campo como a economia criativa, fundada em práticas imaginativas e de inovação, a fim de ganharmos conhecimento e escala para outros domínios.

Provocações Finais

  • Educadores e pedagogos não serão suficientes para desenhar a mudança; deveríamos envolver outros profissionais, como designers, engenheiros e Doutores da Alegria, por exemplo, para pensar os problemas da escola e desenvolver soluções.
  • Não dependamos tão fortemente dos legisladores; alguma dose de desobediência civil pode ser necessária em processos de inovação.
  • Os jovens não são o problema, mas parte da solução. Construir um discurso sobre o jovem que não o envolve como coautor, e ainda identificá-lo como “nem-nem”, me parece uma prática excludente e largamente inadequada para quem desejamos trazer como parceiros da transformação.

Movimentos sociais complexos, descentralizados e distribuídos, a exemplo dos Alcoólicos Anônimos (AA), existem em todos os lugares e ajudam as pessoas quando mais precisam. Vamos transformar a educação num movimento social!

Luciano Meira é Ph.D. em educação matemática pela Universidade da Califórnia (Berkeley/EUA, 1991), mestre em psicologia cognitiva e bacharel em pedagogia. Atua como professor adjunto de psicologia na Universidade Federal de Pernambuco, professor colaborador do Mestrado em Design do CESAR (Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife), bolsista de Pesquisa em Desenvolvimento Tecnológico e Extensão Inovadora do CNPq e Coordenador de Ciência e Inovação da Joy Street, uma empresa de tecnologias educacionais lúdicas do Porto Digital da qual é sócio-fundador. A partir de 2017, Luciano tornou-se também um Lemann Fellow, através da Stanford University na qualidade de Visiting Scholar no Lemann Center for Educational Entrepreneurship and Innovation in Brazil.


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